Oficina realizada em São Gabriel da Cachoeira no Estado do Amazonas, reuniu representações de vinte e três povos indígenas do Alto Rio Negro. Região é uma das sete a fazer parte do programa internacional de formação que, no Brasil, é liderado pelo Projeto Saúde e Alegria
O Rio Negro está localizado no extremo noroeste do estado do Amazonas, abrange os municípios de São Gabriel da Cachoeira, Santa Isabel do Rio Negro e Barcelos. Nessa região vivem mais de 40 mil indígenas em cerca de 750 comunidades que abrigam 23 povos indígenas que pertencem a três famílias linguísticas: Aruak, Tukano e Maku: Arapaso, Bará, Barasana, Desana, Karapanã, Kubeo, Makuna, Mirity Tapuya, Piratapuya, Siriano, Tariana, Tukano, Tuyuca, Kotiria, Baniwa, Kuripako, Hupda, Yuhupde, Dâw, Nadöb, Baré e Warekena.
As comunidades indígenas atualmente estão organizadas em 90 associações de bases que compõem a FOIRN. Essa estrutura de organização política dos povos indígenas do Rio Negro, fortalece a luta em defesa dos direitos, dos territórios e do controle social da implementação das políticas públicas. Esse formato de organização é responsável na conquista da demarcação de 07 Terras Indígenas e desenvolvimento de ações que contribuem com o bem viver indígena no Rio Negro.
A defesa do território envolve uma forte articulação de comunicação. Em 2017 criaram a Rede Wayuri, é composta por comunicadores indígenas que produzem boletins de áudio Wayuri, levando informação sobre os territórios indígenas do Rio Negro para suas 750 comunidades e atuando como animadores de eventos do movimento indígena e mobilizadores de ações voltadas à melhoria do bem viver em suas comunidades. A Rede Wayuri conta com a assessoria do Instituto Socioambiental (ISA) e o apoio financeiro da União Europeia (EU).
A Rede é uma das sete organizações integrantes da Escola de Redes Comunitárias da Amazônia no período de 01 a 02 de abril, recebeu as ações de campo do projeto. Lideranças, comunicadores e alunos da Escola se deslocaram para participar da oficina com o objetivo de refletir e dialogar sobre o território, mapear fortalezas, desafios e sonhos dos povos indígenas do Rio Negro. O processo foi conduzido pelos professores da Escola de Redes Adriane Gama e Guilherme Gitahy de Figueiredo, acompanhados por Gicely Ambrósio, coordenadora do departamento de comunicação da FOIRN e Ana Amélia Hamdan, jornalista do ISA.
“Gosto muito da proposta da Escola de Redes Comunitárias da Amazônia porque não é um projeto fechado, criado entre quatro paredes e levado para as pessoas sem nenhum diálogo. É um projeto aberto, que está sendo construído colaborativamente entre profissionais com relevante experiência com redes comunitárias e os grupos e redes de comunicadoras e comunicadores de 7 diferentes regiões da Amazônia que escolheram alunos para participar da primeira turma”- ressaltou Guilherme Gitahy, professor da UEA e conselheiro da Escola de Redes.
A oficina realizada em São Gabriel da Cachoeira com a Rede Wayuri uniu povos e línguas diferentes, apontando desafios e potencialidades do território, explicou Adriane Gama: “Temáticas como artigo 231, 232, oralidade, radiofonia, telecentro, universidade indígena, autossustentabilidade, fortalecimento das mulheres e dos jovens, diversidade dos povos, medicina tradicional, fake news fizeram parte das Mandalas dos Saberes propostas por eles. O objetivo desta metodologia foi incentivar um mapeamento de temas geradores de acordo com a sua realidade e a partir do fortalecimento das redes de comunicação comunitária, especialmente a indígena da Rede Wayuri na região amazônica”, destaca a pesquisadora.
Para a Coordenadora do Departamento das Mulheres da FOIRN, Larissa Duarte, há uma grande expectativa dos alunos da escola em iniciar as aulas. Para eles, adquirir novos conhecimentos para a comunicação comunitária representa o fortalecimento do território: “Ter três jovens representando os 23 povos indígenas do Alto Rio Negro fortalece a nossa rede de comunicação, mais formação e conhecimento nessa área pra ajudar os parentes nessa nossa luta” – diz.
Através da metodologia usada no encontro, os participantes foram estimulados a refletir sobre suas maiores necessidades, ressaltou Erinelson Freitas da etnia Tukano: “Nessa oficina a gente trouxe vários pensamentos, dificuldades e desafios que a gente tem na nossa comunidade. Isso é importante para todos os povos. A minha expectativa de integrar a Escola é estar ajudando outros a conquistarem seus sonhos”.
A partir dos encontros presenciais que vão acontecer até o fim de abril nas sete comunidades participantes, o conselho da Escola de Redes Comunitárias da Amazônia irá compor a grade curricular da formação que acontece de julho a dezembro – fazem parte do Conselho sete especialistas e sete lideranças de cada organização envolvida.
Os três estudantes indicados pela rede se integrarão aos 21 alunos de três estados da Amazônia Legal (Acre, Amazonas e Pará) na primeira turma da Escola de Redes Comunitárias da Amazônia. As aulas iniciam no mês de julho de 2022 a partir de conteúdos temáticos pensados coletivamente para fortalecer as redes envolvidas.
“É uma honra muito grande pra mim. A gente está unindo as nossas forças e fiquei muito feliz de participar desse primeiro encontro. A gente está começando a se planejar pra participar das atividades” – Emerson da Silva, povo Baniwa, coordenador do departamento de jovens da Rede Wayuri e aluno representante da Rede Wayuri na Escola de Redes.
“Levar informação de tudo que a gente vem criando dentro da Rede Waiury e poder compartilhar e trazer informações para crescer a nossa rede” – Lara Martins, etnia Tariana, comunicadora e aluna representante da Rede Wayuri na Escola de Redes.
“Eles gostaram muito e vão levar para os demais. A expectativa dos três alunos é do início das aulas pra se aprofundar nos temas” – Gicely Ambrósio, Coordenadora de Comunicação da FOIRN.
“A gente tem visto muitas fake news. E a gente tem a prioridade alertar os nossos parentes indígenas que estão em áreas demarcadas. É uma evolução constante. Se a gente não fizer isso hoje, talvez daqui a dez anos a gente não terá a biodiversidade na região” – Juliana Albuquerque, povo Baré, comunicadora e locutora do programa de rádio Papo na Maloca.
“Isso mostra que a comunicação é importante para nós povos indígenas do Rio Negro. Ter três comunicadores que fazem parte dessa rede integrando esse grande projeto é muito rico pra gente porque vai ajudar a ter mais aprendizado e conhecimento” – Claudia Ferraz, povo Wanano, comunicadora da Rede Wayuri, produtora do podcast Wayuri e locutora do Papo na Maloca.
No início deste encontro, houve ainda uma participação muito especial da jornalista Sônia Bridi, que veio a esta região para fazer uma reportagem para o Fantástico, e aproveitando essa oportunidade, foi convidada pelo setor de comunicação do ISA para participar de uma roda de conversa sobre jornalismo ambiental e suas vivências de comunicação com a Rede Wayuri.
Sônia Bridi ao saber da construção da inédita Escola de Redes pelo Projeto Saúde e Alegria e organizações de comunicação comunitária na região norte, ressaltou o apoio a ao Projeto na Amazônia, destacando que “a formação de comunicadores comunitários é fundamental, porque a informação que mais transforma as vidas das pessoas, é a local, saber o que está acontecendo na sua comunidade e no seu entorno, e segundo, porque informação confiável salva vidas. Informação bem apurada é um instrumento para a sobrevivência e de qualidade de vida”, aponta a jornalista.