Movimentos locais, lideranças indígenas e ribeirinhas, movimentos dos atingidos por barragens, organização da sociedade e academia estão reunidos em Alter do Chão, onde discutem ferramentas de defesa de territórios e direitos, águas e cidades amazônicas
Após mais de dois anos de reuniões remotas, o GT Infraestrutura voltou a se reunir presencialmente, em Alter do Chão, no Pará, entre os dias 4 e 6 de julho de 2022. O encontro objetiva promover a articulação das organizações e movimentos sociais na defesa do território e a construção de propostas para uma economia sustentável na Amazônia, cuidando da floresta, das suas cadeias de valor e das pessoas que nela vivem.
Desde segunda-feira (04/07), os participantes compõem mesas que discutem a infraestrutura para uma economia da sustentabilidade na Amazônia, o papel dos Tribunais de Contas no controle da infraestrutura da Amazônia e o papel das instituições financeiras no financiamento dessas infraestruturas.
O Grupo de Trabalho nacional é formado por especialistas, acadêmicos, representantes de movimentos sociais, de base, ONGs para refletir sobre modelos de desenvolvimento para a Amazônia. Para o coordenador do Projeto Saúde e Alegria, Caetano Scannavino, o encontro presencial supre uma demanda urgente de discutir ações propositivas frente ao que vem acontecendo na região. “Ao destruir a Amazônia, comprometemos inclusive o futuro econômico, a geração de energia, dentre outras necessidades onde as florestas são essenciais em plena emergência climática. Infraestrutura da Amazônia, para Amazônia e na Amazônia são pontos de reflexão e debate e esperamos ao final lançar uma carta da Amazônia, que faz uma análise propositiva para contribuir com os setores da sociedade” – conta.
Liderado pelo GT Infra, uma rede de 40 organizações unidas para debater modelos sustentáveis de desenvolvimento baseados na justiça socioambiental, o evento discute ainda ferramentas de defesa de territórios e direitos, águas e cidades amazônicas em grupos de discussão sobre: transportes, energia, cidades amazônicas, mineração e garimpo ilegal.
“Estamos em busca de uma infraestrutura para a região amazônica no sentido de fortalecer e criar uma economia da sustentabilidade, que mantenha a floresta em pé e diga sim para a biodiversidade. Infraestrutura para a Amazônia é a própria floresta que é quem garante a vida, os rios que são base para a economia para as cadeias de valores locais e por onde a população se movimenta, o clima é uma infraestrutura” – ressalta o Secretário executivo do GT Infraestrutura, Sérgio Guimarães.
Durante as mesas, populações diretamente afetadas pelos chamados grandes empreendimentos, falaram sobre a urgência de medidas de apoio e defesa às populações da floresta: “Não se pode discutir infraestrutura na Amazônia sem a presença dos principais povos que aqui habitam. Falar sobre infraestrutura vai muito além do concreto, do aço, do ferro. Através da infraestrutura que é a nossa floresta em pé. Infraestrutura pra nós povos indígenas é o acesso às políticas públicas, a educação, a saúde, a soberania alimentar que vem justamente falar como nós queremos viver enquanto povos tradicionais. A partir do momento que nós somos contra grandes projetos/empreendimentos que nos matam nós somos ameaçados. Se não nos ajudarem a salvar a Amazônia que está em pé, nós vamos morrer juntos com ela. Salvem a Amazônia antes que sejamos mortos com ela” – disse Maura Arapiun do Conselho Indígena Tapajós/Arapiuns (CITA).
Há quatro grandes projetos federais – Ferrogrão, BR-155/158, BR-163/230/MT/PA e BR-230/PA no PA, que possuem o potencial de desmatar 6.989 km² em 30 anos. Sem contar, mais de 90 projetos de rodovias estaduais com impactos não estimados, explicou Joana Chiavari do Climate Policy Initiative PUC/Rio. A pesquisadora questionou como reduzir os impactos socioambientais de projetos de infraestrutura terrestre na Amazônia? Para a estudiosa, a solução está no processo de tomada de decisão da Administração Pública visando a antecipação da análise socioambiental, qualidade dos estudos socioambientais e transparência.
Durante o painel “Infraestrutura para uma economia da sustentabilidade na Amazônia”, o trabalho fez doze recomendações capazes de ter um impacto positivo relevante na condução do processo decisório, na redução de riscos de execução dos projetos e na qualidade da infraestrutura terrestre, especialmente na Amazônia.
A professora da Ufopa e pesquisadora na Sapopema, Socorro Pena, é preciso pensar em infraestruturas básicas adequadas à realidade dos moradores de áreas isoladas: “Para infraestrutura dos povos da Amazônia, precisamos de água, energia, internet. Nós temos observado que o governo tem se preocupado com infraestrutura para os grandes empreendimentos e as comunidades estão sofrendo sem infraestruturas básicas” – lamenta.
Rubens Born do Fundo Casa e Fórum Brasileiro de ONGs e Movimentos Sociais, ressalta que o encontro surge como uma proposta de apontar caminhos para melhorar a vida de quem mora na Amazônia e cuida dela com respeito: “A infraestrutura é importante na vida humana. Nós precisamos de abrigo, alimento, água e compaixão, solidariedade. Estradas, transporte, comunicação fazem parte da nossa vida. O ser humano e as comunidades tradicionais também melhoram a infraestrutura da natureza, com conhecimento tradicional, com sementes e plantas. Nós precisamos cuidar do ambiente porque é ele que nos provê água, alimento e atenção”.
O Fórum Amazônia Sustentável tem coordenação do Projeto Saúde e Alegria, Instituto Socioambiental (ISA), Instituto Ethos, Instituto Reos Partners, Grupo de Trabalho Amazônico (GTA), Conselho Nacional das Populações Extrativistas (CNS), FUndação Konrad Adenauer (KAS) Brasil e Natura. Além disso, recebeu apoio do KAS Brasil, Open Society Foundations, Vale, Uma Concertação pela Amazônia e Natura.
Lançamento de livro de Ricardo Abramovay em Alter do Chão
“Infraestrutura para o desenvolvimento sustentável da Amazônia”, novo livro de Ricardo Abramovay, da USP, oferece uma abordagem para investimentos bons para as pessoas e para o meio ambiente da região. Será lançado nesta quarta-feira (6/7), em Alter do Chão (PA)
O Brasil tem condições de sair na frente na busca por soluções que ajudem o planeta a mitigar os efeitos da crise climática. Apesar disso, está se tornando um pária internacional no quesito proteção da natureza. Em resposta ao paradoxo, o professor Ricardo Abramovay, lança um novo trabalho durante o Encontro do GT Infraestrutura, em Alter do Chão (PA), nesta quarta-feira (6/7). No livro “Infraestrutura para o desenvolvimento sustentável da Amazônia” (Elefante), o pesquisador desenvolve um novo modelo para promover, de fato, o desenvolvimento sustentável na Amazônia, virando referência para o mundo.
O novo trabalho responde a uma solicitação elaborada pelo GT Infraestrutura, uma rede com mais de 40 organizações socioambientais, em torno da pergunta: quais as infraestruturas necessárias à melhoria da qualidade de vida das pessoas, na Amazônia, e a suas atividades produtivas vinculadas ao uso sustentável da biodiversidade? Numa visão contemporânea, Ricardo Abramovay apresenta ao leitor quatro dimensões necessárias para repensar o assunto: natureza, cuidado, serviços e organização coletiva.
Essa organização nos ajuda a pensar a infraestrutura tirando o foco dos megaprojetos, transferindo o olhar para essas quatro dimensões, que resultam num cuidado maior com as pessoas, tanto no campo quanto nas cidades. Só na parte brasileira da Amazônia, vivem mais de 29,6 milhões de pessoas. Abramovay sugere que, as políticas públicas para a região, precisam, antes de mais nada, focar nelas, numa economia do cuidado. Suas provocações apontam alternativas para enfrentar um dos mais importantes desafios contemporâneos: como melhorar as condições de vida e reduzir as desigualdades, não apenas evitando a destruição, mas fazendo uso e regenerando a riqueza natural da qual a própria vida na Terra depende?
“Mas tão importante quanto as iniciativas voltadas a preencher as necessidades em infraestrutura das populações da Amazônia e de suas atividades econômicas (sobretudo as ligadas ao uso sustentável da biodiversidade) é a reflexão sobre o próprio sentido destas infraestruturas e os valores aos quais elas devem obedecer. E na discussão brasileira, latino-americana e global sobre Amazônia é fundamental redefinir o que se entende por infraestrutura do desenvolvimento sustentável”, afirma o autor no sumário executivo do livro.
Para Abramovay, a floresta “é a mais importante e promissora infraestrutura para o desenvolvimento sustentável” e precisa ser olhada como tal. O trabalho, que organiza a reflexão em torno de infraestruturas voltadas às pessoas e ao desenvolvimento sustentável, termina com um conjunto de propostas, das quais a primeira é a criação de um Observatório das Infraestruturas voltadas ao uso sustentável da biodiversidade na Amazônia. O novo livro pode ser adquirido no site da editora Elefante e em livrarias do país. Em 2 de agosto, haverá outro lançamento com a presença do autor, em São Paulo.
Infraestrutura no centro do debate
Os caminhos da infraestrutura brasileira, principalmente os que dizem respeito às regiões brasileiras mais afetadas pelos grandes empreendimentos, como a Amazônia, são o tema central de um evento que reúne, entre os dias 4 e 6 de julho em Alter do Chão (PA), movimentos representativos locais, lideranças indígenas e ribeirinhas, movimentos dos atingidos por barragens, organização da sociedade, academia e jornalistas.
A proposta do encontro é a de promover a articulação das organizações e movimentos sociais na defesa do território e a construção de propostas para uma economia sustentável na Amazônia, cuidando da floresta, das suas cadeias de valor e das pessoas que nela vivem.
Sobre o autor
Ricardo Abramovay é Professor Sênior do Programa de Ciência Ambiental do IEE/USP. Autor de “Amazônia: Por uma Economia do Conhecimento da Natureza”, também da editora Elefante.
Sobre o GT Infraestrutura
O GT Infraestrutura é uma rede focada no estudo e debate da infraestrutura com justiça socioambiental em busca de uma economia da sociobiodiversidade na região amazônica. Para isso promove o conhecimento acadêmico e tradicional e constrói pontes entre comunidades, organizações e pessoas. Desde 2012, vem trabalhando na articulação de e contribuindo com o aperfeiçoamento de organizações e atores sociais da região em temas ligados à infraestrutura, especialmente energia, transportes, clima e cidades.