Caetano Scannavino (PSA) e Alessandra Korap (liderança do povo Munduruku), participam da Plenária da “Água para Saúde” na Conferência Mundial da Água da Organização das Nações Unidas nos Estados Unidos
O risco iminente de escassez de água em nível global, devido ao consumo excessivo e às mudanças climáticas têm alertado para a necessidade de se estabelecer mecanismos internacionais fortes para evitar que a crise global da água saia de controle. Através da Conferência da Água que reúne pelo menos 12 chefes de Estado e de Governo, cerca de 80 ministros, altos funcionários governamentais e mais de 6,5 mil representantes da sociedade civil no evento que iniciou nesta quarta-feira (22), Dia Mundial da Água, e vai até sexta-feira, a ONU pretende alcançar compromissos mundiais para mudar o paradigma de gestão.
Para o órgão internacional que planeja alcançar medidas urgentes através de pactos, traçar estratégias a partir de diálogos coletivos é uma prioridade. A busca pelo ouro e a ameaça à floresta amazônica e seu povo foram temas de painéis em Nova York no marco da Conferência, que contaram com a participação do coordenador geral do Projeto Saúde e Alegria, Caetano Scannavino e da liderança indígena do povo Munduruku Alessandra Korap.
“Temos participado de debates dentro e fora da Conferência, como o realizado na Universidade de Columbia, onde também foi exibido o documentário ‘Amazônia: Nova Minamata?’, do premiado Jorge Bodanzky. Tem sido uma boa oportunidade para falarmos sobre a contaminação dos rios, dos garimpos ilegais, do mercúrio, da situação dos indígenas, dos ribeirinhos e de soluções de acesso à água de qualidade que temos empreendidos juntos no Tapajós”, ressaltou Scannavino.
A liderança indígena Alessandra Korap tem reforçado as denúncias de contaminação das águas do Tapajós pela atividade do garimpo, como porta voz dos Povos Originários. Ativista Indígena do povo Munduruku, Alessandra foi a primeira mulher a liderar a Associação Indígena Pariri e a segunda brasileira a vencer o Prêmio Robert F. Kennedy de Direitos Humanos, em 2020, por seu protagonismo na luta contra o garimpo e desmatamento ilegal em terras indígenas.
“Nossa água está contaminada pelo mercúrio, pelo agrotóxico. Muitas empresas estão privatizando a água, como se ela tivesse um dono. Mas a água é de todos. Todos nós merecemos ter água. Os peixes, as populações, povos indígenas, quilombolas, ribeirinhos, pescadores. Vamos falar de água, respeitando todos os povos porque nós merecemos ter água”, enfatizou Korap.
A participação da liderança no evento internacional se dá através do Projeto ‘Vozes do Tapajós combatendo as Mudanças Climáticas’ por meio da iniciativa global Vozes da Ação Climática (VAC).“O projeto possibilita que as lideranças expressem e se articularem em torno desse tema das mudanças climáticas. É um assunto que afeta a vida de todo mundo. O momento é oportuno para que o mundo entenda que a Amazônia está vivenciando uma crise devido às consequências da garimpagem que afeta as populações indígenas e todos que consomem a água do rio contaminado” – ressaltou o coordenador do PSA, Fábio Pena.
O VAC conta também com o apoio da Fundação Avina, parceira de longa data do PSA. Telma Rocha, diretora do programa de acesso à água, é uma das representantes da Fundação na Conferência: “Nosso principal objetivo é defender uma governança democrática da água e visibilizar as vozes do sul global, em especial para as comunidades indígenas, tradicionais periferias urbanas. Pra gente é um prazer poder estar apoiando a participação do Saúde e Alegria e Alessandra Mundruruku com todos os desafios que os povos indígenas vêm enfrentando“.
O principal resultado da Conferência será o lançamento da Agenda de Ação da Água, que representa comprometimentos voluntários de todos os níveis, incluindo governos, instituições e comunidades locais. A Agenda ajudará a mobilizar ações por parte de governos, setores e demais partes interessadas em alcançar os objetivos e metas globais relacionados à água.
Soluções em meio à contaminação das águas
Ao mesmo tempo em que ocorrem as discussões sobre a crise hídrica na região, a equipe de água e saneamento do PSA, se empenha em levar sistemas de abastecimento para quatro aldeias mundurukus. Um trabalho árduo, com logística intensa e grandes desafios. A primeira missão concluída foi na aldeia Fazenda Tapajós, igualmente impactada pelos garimpos ilegais em terras indígenas.
“Água lá é uma missão quase impossível”, diziam os técnicos. A aldeia, além de ficar num lugar alto, está em cima de uma rocha gigantesca, o que torna muito difícil perfurar poços. Já houve tentativas de furos não tão profundos que acabaram secando. Foi talvez o mais difícil sistema de água que implantamos. O primeiro equipamento de perfuração não aguentou, tivemos que trazer um mais pesado pra varar o pedral, atrasando o sonho da torneira em casa e onerando o orçamento além do previsto”, contou Scannavino.
A comemoração aconteceu no último dia 16 de março, quando a água jorrou da torneira abastecida pelo poço de 153 metros de profundidade. “Um dia histórico para nós, com o sistema sendo entregue com elevado, rede hidráulica, dosador de cloro, e bombeamento movido a energia solar. A gestão será da própria comunidade, com o suporte do DSEI Tapajós pras devidas manutenções”, acrescentou.
O trabalho continua em outras cinco aldeias através da parceria do DSEI, UNICEF, WWF, AVINA e MOTT, Associações Munduruku e à FEPIPA – Federação dos Povos Indígenas do Pará.