Na Oficina realizada em Brasília, Ana Daiane, da Resex Tapajós-Arapiuns e técnica do setor de Infraestrutura do PSA, entregou ao Ministro Wellington Dias carta elaborada por 16 organizações do Baixo Amazonas, cobrando medidas para atender populações afetadas pela maior seca da historia na região
A oficina realizada em Brasília neste início de novembro reuniu representantes do semiárido nordestino e região norte (Amazônia), onde se discutiu a importância do Programa Cisternas/MDS (Ministério do Desenvolvimento e Assistência Social, Família e Combate à Fome) para promoção do desenvolvimento e melhor qualidade de vida de populações dessas regiões.
O titular do MDS, ministro Wellington Dias, participou da oficina e defendeu a necessidade de investir em infraestrutura de água e saneamento, enaltecendo o Programa como de “extrema relevância” ao viabilizar tecnologias sociais de acesso à água que chegam onde não há outras alternativas. “A presença da cisterna que capta água de chuva, por exemplo, é algo fundamental para o desenvolvimento da população do Semiárido”, avaliou. “Eu vivi em uma região do Semiárido e, lá, tem muita irregularidade de chuva. A chuva falha e não tem um ciclo certo. Tem hora que chove demais e depois passa um período longo sem chover”, lembrou.
O Programa Cisternas nasceu a partir da mobilização da sociedade civil, inspirada na Articulação do Semi-árido (ASA). Tem promovido o acesso à água em regiões vulneráveis, especialmente das regiões Norte e Nordeste, suas áreas de abrangência.
Ele vai muito além da simples construção de cisternas com captação de água de chuva. Conta com um portfólio amplo de tecnologias sociais complementares, como captação de água de rios e poços, sistemas de abastecimento tanto autônomos como comunitários, fontes de bombeamento fotovoltaico, redes hidráulicas para distribuição domiciliar, soluções para o tratamento adequado da água, e contempla ainda instalações sanitárias simplificadas, banheiros e fossas sépticas.
“Há muito tempo deixamos de construir apenas cisternas. Hoje, vejo o programa como um conceito de tecnologia social de acesso à água”, avalia Vitor Leal Santana, coordenador geral do Programa Cisternas na Secretaria de Segurança Alimentar do MDS.
São empreendimentos de baixo custo, fáceis de implementar e gerenciar, garantindo um acesso sustentável e seguro à água, fortalecendo a resiliência das comunidades e contribuindo para a segurança hídrica e alimentar. “É uma política pública inovadora, a partir de um arcabouço legal aprovado pelo TCU (Tribunal de Contas da União), que configura os investimentos na forma de tecnologias sociais, o que facilita a execução, dispensa a necessidade de empreiteiras, e viabiliza a execução das obras diretamente pelas organizações habilitadas e associações locais, mobilizando as comunidades e famílias envolvidas no próprio processo de construção através de mutirões, e também na capacitação para autogestão das instalações”, complementa Santana.
Iniciado no semi-árido nordestino, o Cisternas foi sendo estendido para região Norte, motivo de comemoração para os povos da Amazônia, como relata Caetano Scannavino, coordenador do Projeto Saúde e Alegria (PSA), organização com atuação há mais de 30 anos no Tapajós, parceira do Programa: “Só temos a agradecer aos colegas da ASA, pois o que semearam lá está dando frutos aqui também. É uma contradição povos ribeirinhos que habitam a maior bacia de água doce do mundo passarem por estresse hídrico. Mas essa é a realidade, a Amazônia tem sede. E as tecnologias sociais de acesso à água se tornam ainda mais importantes em tempos de emergência climática, como nessa estiagem recorde que está atingindo nossa região”.
Com um dos participantes da oficina, Caetano complementou: “É uma política que promove a participação e cocriação da ponta, o que estimula um processo de melhoramento permanente do Programa a partir de eventos como esse, com a turma de Brasília aberta à escuta e sugestões do pessoal na outra ponta, das comunidades. Isso é fundamental pra melhorar a eficiência, eficácia e efetividade da política, fazendo mais com menos. Parece óbvio, mas quem dera outras políticas públicas pudessem seguir o exemplo”.
A secretária nacional de Segurança Alimentar e Nutricional do MDS, Lilian Rahal, defendeu o trabalho nesses encontros como fundamentais para a implementação do Programa. “Espero que, em parceria com estados e sociedade civil, possamos chegar ao final de 2026 como planejamos, enfatizou. “Estamos aqui reunidos com a expectativa de criar capacidades para aperfeiçoar a implementação do Cisternas em diversos níveis. O Programa não existe sem a parceria da sociedade civil”, acrescentou.
Além disso, Rahal explicou o quanto a iniciativa tem um papel importante diante da crise causada pelo clima e urgência por medidas de adaptação. “Essa tecnologia tem sido capaz de apoiar a população no enfrentamento das mudanças climáticas”, concluiu.
Programa Cisternas na Amazônia
Com a participação de representantes da região Norte na edição 2024 da Oficina do MDS, Vitor Santana destacou a importância e o desafio de adaptar essas soluções para o contexto territorial, climático e ambiental da Amazônia. “Temos apoiado sistemas que garantem o direito ao acesso à água, incluindo a captação de água de chuva, de rios e de poços, além de oferecer tratamento adequado da água e instalações sanitárias.”
Ele ressaltou que essas tecnologias robustas visam enfrentar as complexidades e dificuldades das populações ribeirinhas, extrativistas, indígenas e assentadas da Amazônia. “Envolvemos diretamente os beneficiários e as comunidades no processo de implementação.”
Em meio a maior seca da história da Amazônia, Ana Daiane, da Resex Tapajós-Arapiuns e técnica do setor de Infraestrutura do PSA, entregou ao Ministro Wellington Dias carta elaborada por 16 organizações do Baixo Amazonas, cobrando medidas para atender populações afetadas pela estiagem severa na região. O documento solicita apoio de governos federal, estadual e municipal, com propostas de curto, médio e longo prazos para o enfrentamento de extremos climáticos cada vez mais frequentes na região. Veja o documento.
Da região Norte, além de representantes do Projeto Saúde e Alegria, participaram também da oficina outras organizações executoras, públicas e privadas, entre elas a AFLORA, o Memorial Chico Mendes/Conselho Nacional dos Seringueiros (CNS), e a SEASTER (Secretaria de Assistência Social, Trabalho, Emprego e Renda do Estado do Pará).
Cisternas na região Norte
O Memorial Chico Mendes é uma organização dedicada à defesa do meio ambiente e ao apoio técnico aos povos extrativistas, honrando o legado de Chico Mendes. Entre suas iniciativas está o Programa Cisternas no Amazonas, que visa garantir o acesso à água potável e promover o uso sustentável dos recursos hídricos, mitigando os impactos da seca na região. Este programa é integrado ao Programa SANEAR, que envolve a população em atividades educativas sobre o uso da água.
Willians dos Santos, analista ambiental do Memorial Chico Mendes, destacou a importância dessas ações para fortalecer as organizações dos povos da floresta e influenciar políticas públicas. Segundo ele, “o Programa Cisternas ajuda a reduzir os efeitos negativos da seca, promovendo o bem-estar das famílias e o desenvolvimento sustentável da região.” Santos também enfatizou a necessidade de políticas robustas para a gestão da água e dos recursos naturais, essenciais para que os povos da floresta enfrentem as secas e protejam seus territórios e modo de vida.
A AFLORA é uma organização que atua na promoção do desenvolvimento sustentável e na conservação ambiental. Ela implementa projetos como o Programa Cisternas, que visa garantir o acesso à água potável e sustentável para comunidades rurais, especialmente em regiões afetadas pela seca. A organização tem promovido suporte técnico e capacitação para fortalecer a governança e a gestão territorial dos Yanomami, além de defender ativamente os direitos indígenas. A parceria tem sido essencial para enfrentar desafios ambientais e sociais, garantindo acesso à água potável e uso sustentável dos recursos naturais.
Projeto Saúde e Alegria – Experiências de acesso à água na Amazônia
Desde sua fundação em 1987, a ONG tem se dedicado a melhorar a qualidade de vida das comunidades rurais, implementando soluções de saneamento adaptadas às necessidades locais. As soluções incluem sistemas híbridos, movidos a energia solar e diesel, que abastecem comunidades inteiras de forma acessível e sustentável. O projeto promove a participação comunitária, capacitando moradores para que gerenciem os sistemas de água de forma autônoma, um modelo de gestão que tem sido replicado em outras regiões, fortalecendo a política pública de água do Programa Cisternas.
Com o apoio do Projeto Saúde e Alegria (PSA), o Programa Cisternas tem ampliado o acesso sustentável à água de qualidade para famílias de baixa renda, contribuindo significativamente para a segurança hídrica e alimentar dessas comunidades. Entre 2018 e 2022, o PSA implementou 1.239 tecnologias nos municípios de Santarém, Belterra e Itaituba, beneficiando diversas áreas, incluindo Várzea, Lago Grande e TI Sawré Muybu.
Em 2023, uma nova chamada foi lançada para beneficiar 744 famílias com tecnologias de acesso à água em 25 comunidades e aldeias da Reserva Extrativista Tapajós-Arapiuns. Jussara Batista, coordenadora do Programa de Infraestrutura do PSA, destacou que a falta de saneamento básico na Amazônia, agravada por eventos climáticos extremos, resulta em insegurança hídrica e alimentar. Ela enfatizou a importância do Programa Cisternas para a Amazônia, que, desde 2012, promove acesso à água, alimento e autonomia, utilizando metodologias participativas e focando na adaptação e resiliência climática.
“As ações do Programa são fortemente baseadas no conceito de Tecnologia Social, utilizando metodologias e processos participativos, trazendo a comunidade para junto da construção”, afirma.