Lançado na última quinta-feira (22), estudo apresenta indicadores de três dimensões da população: necessidades básicas, fundamentos para o bem estar e oportunidades. Trabalho é fruto de uma parceria entre o Projeto Saúde e Alegria (PSA) e o Centro Brasileiro de Análise e Planejamento (CEBRAP) com apoio da Natura
Populações tradicionais que vivem em áreas entre os rios e a floresta enfrentam muitos desafios para ter seus direitos fundamentais assegurados. Entre outros fatores, muitas vezes o motivo é a invisibilização destas populações por pesquisas tradicionalistas que não chegam ou não possuem metodologias adequadas para estes territórios e contextos socioambientais.
Como alternativa surgiu o Índice de Progresso Social (IPS), que traz resultados sobre a qualidade de vida da população da região analisando três grandes dimensões: Necessidades Humanas Básicas, Fundamentos do Bem-Estar e Oportunidades, construídas a partir da coleta de informações de outras doze subdimensões.
O IPS é um índice de prestígio internacional criado em 2013 para analisar as condições sociais e ambientais dos países, estados e municípios. Concebido a partir do entendimento de que os índices de desenvolvimento baseados apenas em indicadores econômicos são insuficientes, o IPS analisa exclusivamente variáveis socioambientais para gerar uma nota de 0 a 100, do pior para o melhor.
Na região do Tapajós, os resultados são fruto de pesquisa amostral domiciliar, realizada a partir da aplicação presencial de questionários, com mais de 420 famílias da região, por jovens das próprias comunidades investigadas. Além de Santarém, principal município pesquisado, a amostra contemplou também outros quatro municípios: Belterra, Mojuí dos Campos, Óbidos e Oriximiná, envolvendo áreas urbanas, rurais e ribeirinhas.
A pesquisa contemplou indicadores sobre necessidades mais básicas da população como acesso à água, saneamento, moradia e segurança pessoal; indicadores que tratam de fundamentos do bem estar como acesso à educação básica, inclusão digital, cuidados com meio ambiente; e, indicativos referentes à oportunidades como direitos individuais, liberdade, tolerância, inclusão e o acesso à educação superior.
“Há alguns pontos mais críticos. Pela primeira vez (em pesquisas do IPS na Amazônia) a gente mediu uma incidência mais baixa do consumo de proteínas tanto nas áreas urbanas como nas áreas rurais, que parece refletir esse momento de alta da inflação e das dificuldades de acesso aos alimentos. Um outro ponto bastante gritante foi a exclusão digital das áreas ribeirinhas. Então tem um buraco pra se conseguir avançar na inclusão dessas comunidades na Internet”, disse a pesquisadora responsável, Graziela Castello.
Os dados foram apresentados hoje na sede do Projeto Saúde e Alegria aos parceiros e interessados. Sileuza Barreto, presidente do STTR Mojuí dos Campos, uma das áreas pesquisadas, comentou surpresa ao saber de um dos resultados sobre nutrição: “A gente viu na pesquisa que esse consumo ainda é muito baixo para a nossa produção. Então as pessoas estão precisando realmente ter mais acesso e educação alimentar pra gente ter uma alimentação saudável”.
A falta de acesso ao ensino superior também aparece como o problema mais latente e que atinge as diferentes áreas analisadas, mas especialmente a área rural, onde também se revela um baixíssimo índice de acesso ao ensino infantil. Entre a população, questões como baixo consumo de proteínas (problemas de nutrição) apareceram como fatores de maior atenção. Nas áreas rurais, além da nutrição, que embora em menor grau é também um problema, aparece cuidados médicos básicos como demandas relevantes.
Nas áreas rurais/ ribeirinhas a exclusão digital, pela indisponibilidade de conexão nos territórios e falta de conhecimento sobre o uso das tecnologias também se destacam.
Em relação às questões voltadas ao meio ambiente, nas áreas urbanas é baixo o índice (55) de busca por informações sobre uso e cuidados com a floresta, enquanto que nas áreas rurais o índice é alto (82). A ausência de serviço de coleta de lixo se revelou bastante preocupante (7 numa escala de 100). Por outro lado, perguntados sobre se tem sentido algum tipo de mudança no clima aqui da região, quantidade e época das chuvas, na temperatura, entre outros, tanto nas área urbanas (91) quanto rurais (98) destaca-se o alto índice de percepção sobre mudanças climáticas.
A iniciativa da pesquisa ocorre no âmbito do Programa Floresta Ativa, com apoio do Centro de Informação e Pesquisa (CIP) do Projeto Saúde e Alegria, que vem se estruturando para investir em pesquisas, diagnósticos e monitoramentos da realidade onde a organização atua.
O Programa Floresta Ativa atua no apoio a cadeias produtivas, com objetivo de melhorar a geração de renda das populações ribeirinhas e tradicionais através da promoção de alternativas econômicas sustentáveis para os territórios em que vivem. A importância destas ações encontram eco nos dados da pesquisa. Os entrevistados das áreas rurais têm vínculos fortes com seus territórios, alta confiança na comunidade e sentimento de solidariedade (91 contra 42 dos urbanos) e quando perguntados o que faria você manter a vontade de permanecer em suas atividades de cultivo ou extração de insumos da floresta no futuro, 46% aponta a melhoria da renda como condição para isso.
Para o coordenador do PSA, Caetano Scannavino, os indicadores são importantes para apontar ações de impacto nas áreas mais necessitadas. “É um instrumento para os tomadores de decisão da região. A gente vem identificando algumas questões que precisam melhorar, como o saneamento básico. Acesso a formação de ensino superior. É um desafio. Os dados estão disponíveis para quem quiser. É uma ferramenta que a gente disponibiliza para a região, para os estudantes, academias, universidades, pesquisadores. A ideia é fazer esses estudos futuramente para comparar o que conseguimos melhorar”.
A falta de dados públicos, indicadores sobre a realidade das comunidades é uma barreira para o bom planejamento de ações socioambientais nesta região. “Os investimentos sociais realizados nesses territórios demandam metodologias diferenciadas de acompanhamento para medir o impacto na mudança dos padrões de vida dos beneficiados. Esta pesquisa nos dá uma linha de base para que após alguns anos possamos reaplicar a pesquisa e comparar, medir as mudanças na melhoria da qualidade de vida da população”, diz Fabio Pena coordenador do CIP/PSA.
Confira aqui o relatório na íntegra.