Esse foi o primeiro encontro presencial dos alunos de sete territórios localizados no Acre, Pará e Amazonas. Comunicadores expuseram as lutas e conquistas e dividiram experiências durante o Fórum.
A Amazônia sob a perspectiva dos povos que habitam e fazem comunicação na floresta. Assim foi a participação de 14 vozes dos alunos do projeto “Escola de Redes Comunitárias” durante o 10º Fórum Social Pan-Amazônico, que encerrou no domingo (31) em Belém. O grupo compartilhou lutas, conquistas e aprimorou a formação comunicacional que será aplicada em sete territórios da Amazônia brasileira.
O projeto integra uma articulação internacional liderada pela Associação Para o Progresso das Comunicação, com redes na Europa, Ásia, África e América do Sul. Na Amazônia, o Projeto Saúde e Alegria iniciou há um ano a implementação da iniciativa em aldeias, redes de comunicação e coletivos no Acre, Pará e Amazonas.
A “Escola de Redes Comunitárias da Amazônia” é pioneira no processo de formação dos alunos nos três estados, enquanto agentes transformadores de conhecimento e informação dentro dos territórios.
A participação no FOSPA foi o primeiro encontro presencial dos alunos. “É uma formação múltipla de conhecimentos e vivências através da comunicação. Daqui eles levarão essa bagagem de conhecimento para as localidades onde moram para repassar a outros jovens. Essa é a essência da escola de redes, construir e reconstruir conhecimento para gerar mais frutos”, afirmou a pesquisadora e educomunicadora do PSA, Adriane Gama.
Para o coordenador de redes comunitárias do PSA, Paulo Lima, o FOSPA foi um divisor de nas atividades desenvolvidas com os alunos. Logo que aprovado o edital do projeto, os recursos destinados às redes não previam atividades presenciais por causa da crise sanitária e de saúde provocada pela pandemia de Covid-19. Entretanto, com os devidos encaminhamentos e cuidados foi possível realizar a atividade formativa e participativa dentro do Fórum.
Paulo lembra que o PSA e as entidades já trabalhavam com comunicação comunitária e, com a implementação da Escola de Redes, passou a expandir essa formação desde o ano passado.
“Temos certeza que estamos criando um movimento de retomada de atividades presenciais de comunicadores que estão espalhados pela Amazônia, que não estavam numa rede, para que eles compreendam a importância dessa possibilidade. A Amazônia não é uma coisa só, e isso tudo está sendo respeitado, fazendo com que se compreenda a complexidade da Amazônia, mas também a complexidade do mundo”, destacou o coordenador do projeto.
Participando de rodas de conversas, debates, encontros e momentos imersivos e de diálogo, o grupo leva para casa muito mais conhecimento enriquecido. “Não chegamos construindo de cima para baixo, a gente chegou semeando a partir do próprio solo fértil que eles são e estão no processo construtivo de comunicação. São vivências coletivas e colaborativas entre eles”, disse Adriane Gama, a partir de uma roda de conversa onde os próprios alunos expuseram as experiências vivenciadas no Fórum.
Varley Souza seguiu com a caravana de Santarém para Belém. Ele é da aldeia Solimões e levou ao fórum uma mensagem de reflexão: “Nós não estamos no território, nós somos o território”. O comunicador destaca que essa foi a maneira de chamar a atenção para a importância da preservação das tradições, saberes e terras. “É através de nós que nossos povos são informados para que eles também possam lutar pela Amazônia”, disse o aluno da rede de escolas.
Durante a programação do FOSPA os alunos produziram materiais seguindo eixos temáticos predefinidos. Eles tiveram a liberdade de percorrer as salas e participar dos eventos. Mas, o que eles absorveram dessa imersão? Os jovens comunicadores amazônidas são unânimes em destacar a troca de saberes e o respeito e proteção à floresta e seus povos como as principais mensagens que marcaram essa experiência.
Jovane Neves é professor na aldeia Marajaí, no Amazonas, e viajou à capital paraense com um propósito: voltar ao povo Mayoruna e empregar as experiências no desenvolvimento no próprio território. “Tudo é novo. Essa convivência foi surreal, a gente adquire conhecimentos que serão levados para nossas comunidades e serão discutidos em assembleias”.
Não diferente de Jovane, o jovem Jean Silva saiu do assentamento PAE Lago Grande, em Santarém (PA), cheio de propósitos. Ele luta em defesa e potencial da região através de ferramentas da comunicação. “Onde mora tem muitas cerâmicas e isso tem impacto nas comunidades. Temos que fazer reflorestamento e vamos trabalhar ainda mais com a juventude para conseguir isso”, enfatizou.
As trocas no FOSPA fortaleceram ainda mais as lutas da comunicadora Juliana Albuquerque ao lado povo Baré, do Amazonas. Ela integra a Rede Wayuri de comunicação indígena. Os desafios são muitos, mas a persistência e trabalho em comunidade conseguem conectar 23 povos e respeitam suas línguas e costumes.
“Ser comunicador na Amazônia é não precisar ter tecnologia de ponta, você fazendo a sua parte consegue fortalecer as bases e aprimorar as lutas”, enfatizou Juliana.
As vozes pela floresta em pé, pelo respeito ao território e aos povos não ecoam apenas dentro da floresta. Nas grandes cidades bandeiras são levantadas por coletivos e grupos. Belém foi sede do FOSPA e tem representante dentro da “Escola de Redes Comunitárias”.
Tamires Gomes é do Coletivo Casa Preta, que faz ações de inclusão digital nas ilhas da capital paraense. Para ela, o Fórum e escuta das vivências dos demais alunos deu ainda mais força aos gritos pelo meio ambiente. “Juntar forças, porque a luta deles é também a nossa. Para ser um comunicador precisamos entender o outro e conseguimos isso através da união, e foi isso que vi aqui no FOSPA”.
“São lugares que eu nunca fui, mas através da comunicação entendo o que se passa nesses territórios. Eu levo daqui a experiência deles assim como a diversidade”, completou Samira Dias, do Amazonas, que integra uma comunidade em Itacoatiara.
Atravessar a Amazônia brasileira nos seus extremos já foi um desafio para os representantes do povo Puyanawa, do Acre. Nesse período de FOSPA, Rosa Puyanawa participou de grandes debates, principalmente sobre o clima, e conheceu a realidade de outros territórios, que não é diferente da sua.
Para a jovem indígena que usa as redes sociais para falar do seu povo, levar a bagagem com mais conhecimento à aldeia é a certeza de que o conhecimento será multiplicado.
“Eu quero aprender mais e mais para poder ajudar aqueles que não têm o conhecimento que consigo acessar. Não consigo descrever essa satisfação de participar desse momento, de somar forças, de aprender juntos. Tudo isso é união”, finalizou.
*Geovane Brito para o Saúde e Alegria