Cadeia do látex em ascensão: borracha nativa volta a ser valorizada e impulsiona seringueiros no Pará

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A demanda crescente pela borracha tem aquecido o setor que aposta em compensações ecológicas para fortalecer negociações com seringueiros no Oeste do Pará

Com otimismo no mercado da borracha, a Cooperativa dos Trabalhadores Agroextrativista do Oeste do Pará (ACOSPER) avalia uma forte oportunidade na retomada da produção de látex, a partir da extração da seiva da seringueira (Hevea brasiliensis). O produto que dá origem à borracha natural tem movimentado a cadeia produtiva que se organiza para conseguir atender a crescente demanda. Segundo o presidente da Acosper, Manoel Edvaldo, em 2022 a produção brasileira foi de 220 mil toneladas, enquanto que o consumo das empresas seria o dobro.  “Mais da metade ainda é necessária para suprir a demanda”, ressalta.

No auge do Ciclo da Borracha (fim do século XIX e início do XX), essa atividade impactou significativamente a economia, costumes e a rotina de comunidades tradicionais e indígenas da Amazônia. Com o abandono dos seringais, muitas populações migraram para as áreas urbanas em busca de trabalho, deixando parte da cultura ancestral para trás.

A movimentação do setor nesse último ano tem mostrado que a cadeia da borracha pode representar uma forte aliada à conservação das florestas. Com a procura das empresas, organizações cooperativas, têm se articulado para atender o mercado a partir da  borracha nativa, mais do que a ‘plantada’, explica o assessor de cadeias produtivas do Programa Floresta Ativa do Projeto Saúde e Alegria, Marllisson Borges. “Estou extremamente feliz em ver esse resgate da cadeia e valorização do seringueiro na Amazônia toda e aqui no Tapajós chefiada pela ACOSPER e com nosso apoio”.

Ao resgatar o trabalho nos seringais, Marllisson afirma que há também impacto na dinâmica sociocultural dos seringueiros tradicionais da Amazônia, valorizando o esforço desses povos  que prestam importantes serviços ecossistêmicos para a sociedade em geral preservando a floresta em pé. “ Hoje muitas empresas do setor pagam além do valor do produto um aditivo para borracha nativa que é um pagamento de serviço por contribuição socioambiental  aos extrativistas por esses serviços prestados na manutenção da floresta em pé”, destaca. Além disso, a cadeia produtiva é um bem cultural e imaterial dos povos e comunidades tradicionais da Amazônia, concentra saberes e práticas ancestrais com importantes conhecimentos e técnicas que os grupos sociais desenvolveram ao longo de gerações que precisa ser preservado e transmitido às futuras gerações.

Em 2023, foram dados os primeiros passos para fortalecer a cadeia. Um encontro multiserial do mercado da borracha Amazônica foi realizado nos dias 3 e 4 de maio de 2023 na cidade de Porto Velho em Rondônia, onde foi pactuada a retomada da atividade na região.

Não temos que produzir só borracha, temos que produzir seringueiros também” – Paulo Roberto, comunidade Pedra Branca.

Recentemente, a ACOSPER participou da semana da sociobiodiversidade que aconteceu entre 31 de outubro e 06 de setembro em Brasília, quando foi oficialmente criado o coletivo Borracha da Amazônia.

Aliança pela borracha

Visando fortalecer a estratégia e garantir meios para aumentar a produção, o PSA e a Acosper promoveram no período de 8 a 9 de setembro o Seminário de fortalecimento da Borracha na RESEX Tapajós-Arapiuns para discutir caminhos para melhorar o padrão de qualidade do produto.

Vinte e cinco seringueiros e seringueiras do Polo CEFA Tapajós, Arapiuns e Arapixuna (comunidades Lago Central e Piauí) participaram e puderam conhecer melhor como funcionam os contratos, estratégia de comercialização da Acosper e construir prensas para a borracha.

Foi um momento importante e emocionante. Todos os participantes deram seu depoimento muito emocionados e assumiram o compromisso de trabalhar para aumentar a produção, respeitando os padrões de qualidade com o zelo pela floresta, seringueira, borracha, cooperativa”, esclareceu Manoel.

A aliança renovada entre os seringueiros da região tem como um dos desafios defender a perpetuação da cadeia da borracha e o extrativismo, a partir da organização dos processos, respeito à biodiversidade e geração de renda. O Programa Floresta Ativa do PSA, através de seus parceiros como o Fundo Amazônia, tem ampliado ações de assistência técnica para fomentar a renda com a floresta em pé. Um trabalho promovido coletivamente e reavaliado com frequência, conta o coordenador de ATER do PSA, Márcio Cunha: “esse planejamento perpassa pelas melhorias de planejamento de números de seringueira e metas de produção. O objetivo é que os seringueiros sejam capazes de entregar toda matéria prima para que a Acosper cumpra com seu primeiro contrato voltado à borracha”.

Metas e desafios

Um contrato anual estipula a aquisição de 30 toneladas de borracha prensada pelo coletivo de seringueiros, garantindo um compromisso de compra ao longo de três anos, incluindo pagamento por serviços socioambientais e reajustes anuais baseados na qualidade do produto.

Para atingir a meta, os seringueiros estabeleceram o indicativo de 10 toneladas de borracha/ano, com maior participação de famílias. No próximo ano, o sonho é que parceiros comerciais comprem borracha de seringueiros locais, atingindo uma coleta conjunta de 8 a 10 toneladas com preços melhores e o comprometimento de pelo menos 200 kg por família entre os 52 seringueiros atualmente cadastrados.

Na avaliação dos seringueiros, a situação atual era de desânimo devido a experiências anteriores frustradas, enfrentamento de preconceitos nas comunidades e baixa participação dos jovens, apesar dos esforços de incentivo. No entanto, a comunidade permanece dedicada à preservação das áreas de seringais nativos. As estratégias a serem mantidas incluem a preservação dos seringais nativos, manter o trabalho com a seringa e a roça paralelamente e em sinergia, a realização de oficinas continuadas para aprimorar a qualidade do produto, visitas aos produtores para promover um senso de valorização e a criação de espaços de diálogo entre os seringueiros e a diretoria da cooperativa, além de contínuo apoio à juventude para se integrar a cadeia.

Este momento representou um passo importante no fortalecimento da cadeia da borracha na região, delineando um caminho promissor para os anos vindouros. Algumas das ações que eles identificaram como essenciais incluem manter os seringais, se comprometer com a qualidade do produto, engajar a próxima geração e se esforçar para garantir o cumprimento do contrato”, acrescentou Borges.

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