Comunidades que mais protegem também são as que mais são impactadas pelos efeitos das mudanças climáticas. Foi a partir desta constatação que dezenas de vozes da própria Amazônia se uniram nesta sexta-feira (29), durante a roda de conversa “Justiça climática: visões e vozes amazônidas”, em Belém, dentro da programação do 10º Fórum Social Pan-Americano (FOSPA).
O momento contou com a participação de grandes nomes na luta pela defesa das florestas, como a ambientalista e filha de Chico Mendes, Ângela Mendes, e Suzy Evelyn Silva, da Coordenação das Organizações Indígenas da Amazônia Brasileira – COIAB.
Esse encontro faz parte do Programa Vozes Pela Ação Climática Justa (VAC), que atua em 7 países. Na Amazônia, o objetivo é ocupar espaços e dar voz e visibilidade às populações para tomada de decisões. “A ideia é fortalecer essas pessoas para que elas cada vez mais tenham a sua visão de mundo no Brasil e fora também”, explicou Juliana Strobel, da Fundação Avina.
O foco das iniciativas do VAC é principalmente a Amazônia, onde são apoiadas e fortalecidas organizações da sociedade civil que levam para as realidades locais a discussão da agenda climática, com ribeirinhos, quilombolas, indígenas e populações tradicionais.
No oeste paraense, o Projeto Saúde e Alegria é uma das iniciativas que realizam os debates através do projeto “Vozes do Tapajós: combatendo mudanças climáticas”.
“É uma pauta global, mas muitas vezes aqueles que mais protegem o meio ambiente, porque dependem mais desses recursos, são os mais impactados. A discussão é sobre quem paga a conta final pelos impactos causados às vidas de todo mundo. Precisamos defender programas e políticas públicas que defendam essas populações”, destacou Fábio Pena, coordenador de educação e comunicação do Projeto Saúde e Alegria.
Apesar da importância da Amazônia à saúde do planeta, ainda segundo Pena, o Brasil perdeu nos últimos anos força nessas discussões e as políticas públicas se enfraqueceram. “Vemos um processo de degradação ambiental aumentar e uma narrativa de que essa problemática não existe. Se a gente nega um problema, uma hora a conta chega e quem sofre mais são os menos favorecidos economicamente”.
Fazem parte da coalização do “Vozes do Tapajós” na região do alto e médio Tapajós e Baixo Amazonas: PSA, Sociedade para Pesquisa e Proteção do Meio Ambiente (SAPOPEMA), Conselho Indígena Tapajós Arapiuns (CITA), Conselho Indígena Tupinambá (CITUPI), Suraras do Tapajós, Coletivo Audiovisual Munduruku Dajekapapeypi e Sindicatos dos Trabalhadores e Trabalhadoras Rurais de Santarém (STTR).
A indígena Iane Borari integra o coletivo Suraras do Tapajós’. Para ela, as discussões ampliadas dentro do fórum fortalecem o trabalho já desenvolvido nas bases. “Utilizar esse espaço de forma dinâmica para que as organizações possam falar sobre o que tem sido feito dentro dos territórios e como é que pode compartilhar esse modo de atuação e captar de outras organizações o que eles estão fazendo para somar junto com as atividades que têm sido feitas”.
Durante a roda de conversa, a coordenadora-executiva da COIAB destacou a transformação causada pelo poder de contribuir e potencializar lutas e discursos, principalmente no período de negação a tantos direitos indígenas no Brasil. “É um trabalho das comunidades como um todo. É uma luta diária, e ela parte das forças das nossas bases, que nos fortalece, se une e se mobiliza para defender os direitos indígenas”, disse Suzy Evelyn Silva.
O momento de discussão, troca e diálogo foi mediado por Ellen Acioli, integrante da Fundação Avina. Entre as trocas ela destaca a importância de explicar a aplicação dos termos “Justiça Climática” e “Mudanças Climáticas” e os impactos nos territórios.
“A gente só pode criar soluções e pensar em estratégias de mitigação, adaptação e suporte se a gente ouve as comunidades. Potencializar essas vozes para que cheguem além dos territórios é extremamente importante. Fazer justiça climática é a construção a partir das perspectivas de cada que está sofrendo com os impactos.”
Os trabalhos começam a dar mais efeitos a partir das trocas de experiências entre as comunidades, como a realizada durante o Fórum. Segundo a ambientalista Ângela Mendes, é preciso alinhamento e organização nas frentes de lutas e resistência, principalmente no atual cenário de ataques e ameaças aos povos tradicionais e territórios. “Ter esse ambiente de integração, debate e construção, às vezes de soluções coletivas, é ter um espaço estratégico na nossa luta de hoje”
Ao final da roda de conversa, Ângela leu a carta que o pai Chico Mendes deixou para encorajar tantos outros protetores das florestas. A ambientalista ressaltou que o que o pai plantou no passado nos seringais do Acre foi abraçado pelos povos tradicionais e comunidades. “É mais uma forma de luta por tudo que eu trago e já vivenciei, e também é uma história de legado por essa luta. A gente sabe que são milhares os herdeiros de chico”, finalizou.
*Geovane Brito para o Projeto Saúde e Alegria.