Durante a semana da Amazônia, indígenas de 25 aldeias participaram de intervenções em prol da vida, do território e da floresta.
Quem vive às margens do rio Tapajós vê diariamente balsas levando riquezas e deixando para trás impactos aos povos tradicionais e aldeias. Para mudar essa realidade e chamar atenção para a destruição dos territórios, rios e floresta, 25 aldeias do povo Tupinambá do Baixo Tapajós, que ficam na Reserva Extrativista Tapajós-Arapiuns se reuniram na semana da Amazônia em um “grito ancestral”.
O evento é realizado há cinco anos para alertar sobre as ameaças ao rio Tapajós e reafirmar e valorizar a cultura Tupinambá. Em 2022, a mobilização foi realizada de 7 a 10 de setembro e fez parte da programação do movimento ManiFestar na semana da Amazônia. Iniciando na aldeia Santo Amaro, com a assembleia da juventude Tupinambá que reuniu cerca de 150 jovens.
Membro do Conselho Indígena Tupinambá – CITUPI, Lucas Tupinambá explica que estiveram em pauta diversos assuntos, mas principalmente como os jovens podem usar o audiovisual para denunciar crimes dentro do território. “Foi um dos debates muito importantes para a nossa juventude porque a gente já conseguiu ter engajamento sobre o que a gente pretendia ter como resultado. Nossa juventude é uma juventude bem engajada, rapidamente conseguiu compreender o sentido da defesa dos nossos territórios, o sentido de estar atento para todas das movimentações que vão de encontro aos nossos direitos do bem viver”, disse.
O encontro da juventude teve o apoio do Projeto Vozes do Tapajós sobre Mudanças Climáticas, coordenado pelo Projeto Saúde e Alegria – PSA em uma coalizão de várias organizações locais, entre as quais o CITUPI, que tem o objetivo de apoiar a participação das populações tradicionais nos debates da agenda climática. “É muito bonito ver a mobilização da juventude debatendo os problemas que afetam seus territórios, defendendo os modos de vida que garantem o bem viver dessa população, a relação saudável como o meio ambiente, e conectando esses assuntos aos debates sobre as mudanças climáticas com a sua própria linguagem” disse Fábio Pena, coordenador do projeto pelo PSA.
A aldeia Muratuba foi a comunidade base que recebeu a audiência pública sobre contaminação mercurial que, infelizmente, é uma realidade e tem contaminado comunidades e aldeias às margens da bacia do rio Tapajós. No dia 9 de setembro cerca de 400 pessoas participaram dos debates. Na pauta a preocupação das aldeias sobre o que vem acontecendo com a poluição cuasada pelo garimpo ilegal no alto e médio Tapajós que também impacta as aldeia do baixo Tapajós.
Presentes no evento, um grupo vindo das aldeias Munduruku do médio Tapajós, município de Itaituba, também participou do evento expondo a realidade que vem enfrentando. Lá o problema dos garimpos ilegais é mais evidente e serve de alerta para os que vivem mais abaixo do rio. “A gente vive numa situação que há muito tempo nossas lideranças vem denunciando as influências que o mercúrio vem causando nas pessoas, nas mulheres grávidas, nas crianças”, comentou o jovem lider Beka Munduruku.
No evento foi produzida uma carta com demandas das aldeias sobre esse e outros problemas, com foco na necessidade de ampliar as testagens e exames na população para medir o nível de contaminação por mercúrio.
“A gente precisa estar atento, a gente precisa trabalhar em rede contra o mercúrio, contra qualquer outro empreendimento que queira entrar no nosso rio tapajós”, destacou Lucas Tupinambá.
E foi da margem do rio que se vê balsas levando riquezas do Tapajós que a maior mobilização do grito ancestral foi realizada no último dia 10. Os indígenas fizeram intervenções de ativismo nas embarcações que levam soja, madeira, minérios e outros produtos.
Na ponta do Surucuá os indígenas abordaram as balsas e estenderam mensagem em defesa do território. A ação foi pacífica e contou com a presença de outros povos indígenas da região, comunidades tradicionais e movimentos sociais.
“O manifesto do grito ancestral diz ao estado brasileiro que somos contrários a passagem de balsas e tudo o que ela traz de consequência para nós. O fenômeno das terras caídas é impacto do fluxo de balsas, que também prejudica a pesca. A balsa acelera ainda mais a distribuição do mercúrio e da lama no rio tapajós”, disse Lucas.
O grito ancestral reuniu os indígenas nas discussões durante quatro dias, mas as mobilizações para um Tapajós Vivo continuam diariamente nas próprias comunidades e nas aldeias.
*Geovane Brito para o Saúde e Alegria | Fotos: Alice Nin.