Munduruku – Coletivo Poy, criado para estruturar alternativas sustentáveis, já tem seus primeiros resultados com mais de 36 toneladas de castanhas do Pará comercializadas

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 A resistência das populações mundurukus do Alto Tapajós tem gerado a conservação de árvores centenárias. A floresta em pé, retribui com frutos que geram sustento para quem vive da Amazônia

A união de esforços de vinte e três aldeias Munduruku resultou na coleta de quase três mil latas de castanha do Pará, equivalente a aproximadamente 36 toneladas do fruto. A iniciativa é do Coletivo Poy, criado em 2022 pelos próprios indígenas visando estruturar alternativas econômicas sustentáveis, que gerem renda, tragam segurança alimentar, valorizem as culturas locais e mantenham a floresta em pé, em meio a toda degradação, conflitos e consequências da mineração ilegal nos seus territórios.

“Nós, mundurukus, ficamos muito satisfeitos por sustentar nossos filhos e proteger a nossa natureza. Isso que nós estamos precisando no nosso território”, comentou João de Deus Munduruku, coordenador eleito do Coletivo.

“É fundamental ter alternativas ao garimpo, mostrando que não se faz dinheiro só com ouro. E que nem tudo é dinheiro. O que a gente testemunha lá é que o ouro está beneficiando alguns poucos, e deixando a conta do estrago pra todo mundo pagar. Não se sabe pra onde vai esse ouro extraído de lá. Até porque se a gente olhar as sedes municipais, Jacareacanga por exemplo, se fosse um modelo de progresso, depois de décadas de garimpagem deveria estar 100% com saneamento, ruas asfaltadas, hospitais e escolas de primeira. Só que não, o que a gente vê é que o município está no andar de baixo dos indicadores sociais do país”, avalia o coordenador geral do Projeto Saúde e Alegria, Caetano Scannavino. “A estruturação do Coletivo trouxe uma esperança pra esse povo sofrido e guerreiro, mais do que renda,  de que há outros caminhos, com floresta em pé, rios limpos e bem-viver. Todo apoio ao Poy”, complementou.

Lideranças indígenas do alto Tapajós em reunião com a coordenação do Projeto Saúde e Alegria.

Para o frade franciscano Frei Messias Sousa, que vive a serviço do povo Munduruku no Alto Tapajós e apoia a iniciativa, é preciso disseminar a perspectiva de uma sociedade que respeita os direitos coletivos e consome com equilíbrio e responsabilidade: “Eu sou floresta, floresta sou eu. Não é vender castanha. Nós queremos demonstrar que nós dependemos da floresta. Não queremos entrar num mercado de produção. Nós queremos mostrar que é possível, que existe uma cultura, existe um saber. A floresta não é vendida, ela está aí pra gente conviver”, ressaltou. “A maioria das doenças é causada por produtos industrializados, envenenados, e nós somos fruto do que a gente come. Nós precisamos da floresta saudável para continuarmos saudáveis para defender a extensão da nossa existência. Todos os atos que provocam a destruição da floresta, como, por exemplo, a mineração ilegal que gera a contaminação por mercúrio, o desmatamento, a poluição e sérios problemas socioambientais, são meios de profanação do solo sagrado. Por isso, é preciso defender o Território, pois dele provém nossa existência.“.

Nos caminhos da floresta, castanheiras centenárias representam a resistência e o sonho dos povos tradicionais em conquistar segurança econômica a partir da coleta de frutos de espécies de valor comercial e manejadas na área. Em agosto de 2022, eles solicitaram a visita do Projeto Saúde e Alegria para planejar as atividades produtivas potenciais e fornecer assistência técnica aos agroextrativistas. “Eles mesmos organizaram quase 70 lideranças do rio Cururu, Teles Pires e início do Tapajós, e a gente realizou as oficinas para começar a construir a organização, estruturação interna intercomunitária, definição dos coletivos, das articulações, responsabilidades e papéis, de modo a poder avançar na estruturação dessas cadeias produtivas”, explicou o coordenador de Organização Comunitária do PSA, Carlos Dombroski.

A partir das discussões sobre ações de mapeamento, coleta, plantio e capacitações, a equipe técnica entrou em campo através do Programa de Assistência Técnica do Floresta Ativa do PSA. A primeira oficina ocorreu no período de 9 a 12 de dezembro, focada na cadeia da castanha e etapas a serem seguidas desde a coleta até a comercialização. “A cadeia da castanha tende a ser uma grande fonte de renda das famílias Mundurukus, levando em consideração a quantidade disponível e a força de vontade do povo em manter a floresta em pé e buscar sua sobrevivência por meio da conservação do que seu território lhe proporciona”, contou a engenheira florestal do PSA, Laura Lima.

A semente da castanha é um produto não-madeireiro promissor para comercialização devido ao grande potencial de mercado e disponibilidade em larga escala no território Munduruku. Uma das metas do Floresta Ativa é oportunizar para populações indígenas a formação para potencializar as atividades agroextrativistas em áreas de floresta. Na primeira capacitação, foram entregues EPIs para atuação em campo. A próxima formação está prevista para este semestre, objetivando encaminhamentos para a safra de 2023 e o planejamento para o próximo ano.

É uma iniciativa dos povos indígenas no rio Cururu que sempre defenderam um lugar conservado. Se tem castanha é porque eles lutaram muito. A organização dos povos e aldeias do Alto Tapajós está demonstrando que é possível buscar alternativas econômicas para alimentar a família”, ressalta Dombroski.

Entrega dos EPIS aos indígenas do alto Tapajós durante criação do Coletivo em 2022.

Com a coleta em andamento, os indígenas estimam que a atividade deve atingir cerca de três mil latas de castanha. A próxima etapa é o transporte até o município de Óbidos, onde uma empresa compra os frutos e os beneficia. “Isso demonstra que as aldeias têm um poder de organização muito forte e isso mostra que é possível ter grandes alternativas contra a entrada do agronegócio, das madeireiras, contra as mineradoras”, acrescenta o gestor.

O Rio Tapajós, principal curso d’água que banha as aldeias do povo Munduruku têm sofrido impactos com o garimpo ilegal, que é uma atividade constante neste percurso, onde muitas aldeias que existem ali sofrem com a falta de água limpa, contaminação da sua principal proteína (peixe), e a falta de renda por optarem por viver unicamente da rica biodiversidade existente em seu território.

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