Representantes de nove projetos selecionados no Edital Rede Comunitária Floresta Digital se reuniram na Escola Floresta Ativa, instalada no CEFA em Santarém. Lideranças e representantes do CNS, COIAB e CONAQ discutiram ideias para conectar e divulgar territórios produtivos e sustentáveis na Amazônia
Além de abrigar uma rica biodiversidade, a região amazônica também é um espaço de criatividade e inovação. Apesar de seus potenciais, muitas comunidades estão isoladas e enfrentam dificuldades para comunicar suas experiências positivas e a realidade que vivenciam. Lançado em abril deste ano, o edital Rede Comunitária Digital selecionou nove projetos que tinham como desafio estabelecer redes comunitárias ou colaborativas na Amazônia, conectando iniciativas e projetos sócio produtivos existentes ou em desenvolvimento.
A primeira atividade presencial da iniciativa, que é coordenada pelo Projeto Saúde e Alegria e DW Akademie com apoio da União Europeia, aconteceu no período de 08 a 11 de junho na Escola Floresta Ativa, localizada na região da Resex Tapajós-Arapiuns em Santarém. O encontro contou com a participação de três organizações de base: Conselho Nacional das Populações Extrativistas (CNS), Coordenação das Organizações Indígenas da Amazônia Brasileira (COIAB) e Coordenação Nacional de Articulação das Comunidades Negras Rurais Quilombolas (CONAQ) e de mais de vinte lideranças das organizações integrantes, representando os estados do norte do país: Acre, Amapá, Pará e Amazonas.
“Nosso objetivo é promover a inclusão digital dos povos da floresta, respeitando sua linguagem e visão de mundo. Para alcançar isso, foi essencial ouvir as vozes das comunidades, que frequentemente compartilham necessidades semelhantes, como por exemplo melhorar a conectividade à Internet e a infraestrutura local, divulgar serviços e produtos locais por meio de mídias digitais, rádio e vídeo, capacitar membros das comunidades para a comunicação comunitária e o uso de serviços online e oferecer novas perspectivas aos jovens e às mulheres da comunidade”, destacou Luiza Cilente da DW Akademie.
O Laboratório de Ideias possibilitou mapear a situação da conectividade nos territórios, refletindo e propondo estratégias para conectar as redes. A metodologia participativa inspirada nas experiências desenvolvidas pelo PSA, foi destacada pelo coordenador do Programa de Educação, Cultura e Comunicação, Fábio Pena: “a proposta de capacitar a juventude em relação a essas temáticas que unem tecnologia e a realidade socioambiental das comunidades. Fazer uma inclusão digital de fato, porque não basta promover o acesso à internet, mas sim facilitar os usos sociais, culturais e econômicos nos potenciais das comunidades”, ressalta.
As atividades foram conduzidas com muita colaboração e saberes, destacou a pesquisadora do projeto, Adriane Gama. A finalidade foi construir os primeiros passos de uma rede comunitária digital floresta em pé, integrando as particularidades de cada região abrangida: “Esses dois representantes de cada território aprenderam desde construir planilhas orçamentárias a mapear de forma lúdica e afetiva, os seus territórios. Elaborar seus primeiros objetivos a partir de seus sonhos sempre levando em consideração o fortalecimento das mulheres e das suas cadeias socioprodutivas e incentivo a comunicação comunitária e a uma conectividade significativa”.
Isabela da Cunha Campos, 26, de território de ribeirinhos do município de Acará, próximo a Belém no Pará, comentou sobre a alegria em ter sua região representada na iniciativa e poder contar com o fortalecimento por meio do projeto: “a gente vai conseguir ter uma rede que a gente consiga fortalecer os projetos que temos dentro da comunidade. Esse é um projeto que é feito para nós, pensados em nós e que entendem a nossa realidade, não passam por cima das nossas dificuldades”.
Tati Santos do Quilombo do Curiaú, estado do Amapá, falou sobre os desafios da conectividade no seu território. Sem acesso adequado à internet, por exemplo, sofrem com a falta de espaço para visibilizar suas potencialidades. “Através do projeto a gente vai dar visibilidade às produções que a gente tem dentro do Quilombo e é uma forma também de atrair outros parceiros, porque a gente tem caminhado muito sozinho, sem política pública que nos atenda”.
Karol Puyanawa, indígena Puyanawa, do interior do Acre, no município de Mâncio Lima, contou sobre a experiência em integrar a Escola de Redes Comunitárias da Amazônia, liderada pelo PSA entre 2021 e 2023. A experiência deixou um legado que agora será fortalecido com novas ações: “Esse fortalecimento que a gente está precisando. Nosso povo é um grande produtor da farinha de macaxeira, produz muito artesanato e hoje a gente realiza grandes festas na nossa comunidade, que gera economia para as famílias, gera renda, mas hoje a gente vê uma deficiência nessa parte da comunicação, porque hoje a gente não tem pessoas preparadas para atuar nessa área da comunicação, seja na logística, na divulgação, seja nessa área de marketing”.
Josias Sateré, da Associação KAPI Sateré-Mawé, Estado do Amazonas, relatou a alegria com a renovação dos sonhos despertados durante o laboratório: “Nos trouxe esperança de poder olhar os nossos problemas com mais otimismo. E nos deu a garantia de que nós podemos fortalecer a nossa cultura, os nossos costumes, as nossas tradições. E também valorizar a nossa bioeconomia protagonizada pelos nossos agricultores, artesãos, produtores culturais e fortalecer a luta indígena do povo Sateré-Mawé”.
Zenilda Kumaruara, coordenadora da TI Kumaruara, região de Santarém, no Pará, compartilhou o mesmo sentimento de esperança. Para a liderança, a iniciativa vai somar à organização representativa: “Esse projeto beneficia o nosso território para empoderar as mulheres, ajudar a fazer a venda dos produtos e administrar as nossas aldeias. A antena é uma ferramenta muito importante para nos comunicarmos com a Amazônia e com o mundo. Vai facilitar essa vida que a gente leva nas aldeias e diminuir as dificuldades que estamos enfrentando”.
Outro ponto forte da experiência, será o uso de tecnologias livres pelas organizações, através do contato mediado pela equipe da Casa Preta de Belém. Aline falou sobre essa responsabilidade: “O nosso papel vai ser desempenhar como mostrar outras tecnologias de software livre, além das que já existem no mercado. Incentivar que as comunidades sejam mais participativas e curiosas para saber como funciona a tecnologia, como pode ser útil para mostrar pro mundo os seus territórios, economia, mostrando que é possível manter a floresta em pé”.
Cada território receberá o valor de aproximadamente R$90 mil para investir em ações e estruturação de suas organizações ao longo de três anos. A equipe de assessoria técnica do projeto fará o acompanhamento e mentoria para evolução das atividades.
Fotos: Adriane Gama/PSA.