Moradores das comunidades São Domingos, Pedreira e Nazaré na região da Flona em Belterra praticam o manejo da espécie florestal na região há mais de vinte anos. Em 2021 o trabalho está mais estruturado, com apoio de novas infraestruturas;
É ainda madrugada, quando inicia a jornada dos moradores das três comunidades. Equipados, saem para coletar ouriços de andiroba floresta adentro. Um trabalho que reúne esforços de homens e mulheres, nativos da região da floresta nacional do Tapajós. Todas as etapas, da coleta à secagem dos frutos são compartilhadas, explica a coordenadora do grupo jovem de São Domingos, Amanda Caroline: “As mulheres vão junto para o mato, coletando. Elas gostam. Até os homens falam se as mulheres não estiverem com nós, não é divertido, porque é um ajudando o outro”.
O trabalho de coleta é feito por moradores experientes, afinal a sabedoria sobre os usos dos recursos que a floresta oferece nas comunidades é ancestral. O óleo da andiroba sempre foi usado na medicina tradicional. Mas agora se tornou também opção de fonte de renda.
É preciso conhecer a dinâmica da floresta, conta o jovem coletor, Miguel Vasconcelos: “Quando a gente sai pra mata, tem que pedir licença. A gente sabe que a floresta tem mãe. A gente tem que estar preparado com os EPIs completos pra não ter problema”.
Esse é um ritual indispensável e compartilhado por todos, confirma Gilvandro da comunidade Pedreira: “Pra gente entrar na mata a gente tem que estar equipado. Nós precisamos conhecer a área. É a nossa convivência com a floresta, a gente respeita”.
Enquanto um grupo segue com as coletas, outro se reveza na secagem pelos turnos de manhã e tarde. O processo envolve o esforço para mexer as amêndoas no secador e selecionar os frutos comprometidos, dos bons.
O manejo da andiroba reúne um trabalho minucioso que inicia no planejamento. Em 2020 foram feitas avaliações para apontar caminhos para infraestruturas aptas ao beneficiamento, secagem da semente e armazenamento. Para os moradores, a estruturação da atividade melhorou no último ano e já planejam ampliar a iniciativa: “a ideia é no futuro, produzir óleos porque nos dão um ganho maior. Mas pra gente chegar lá, precisamos produzir daqui. Logo mais, encerrando a andiroba, vamos começar copaíba, piquiá, cumarú. Todos esses produtos dão retorno” – relatou Adailson Pereira de São Domingos.
O Projeto Saúde e Alegria, a Federação da Flona, a Coomflona e o ICMbio estão juntos para fortalecer a atividade para promoção da conservação e geração de renda aos comunitários. “É algo novo que a gente está com bastante expectativa de crescimento. Não só com a semente da andiroba, mas cumarú, piquiá, copaíba, castanha. Para que isso fosse pra frente, nós entramos em contato os parceiros, elaboramos um projeto básico para que a gente pudesse garantir a entrada, permanência, desenvolvimento das áreas, como a reforma e construções de infraestruturas para os moradores trabalharem” – ressaltou Steve Mcqueen – engenheiro florestal do PSA.
Os extrativistas recebem apoio técnico do PSA, com acompanhamento contínuo. Durante as coletas, técnicos estão realizando estudo dos frutos e marcação dos pontos de GPS para realizar inventário da área para que novas espécies sejam mapeadas e incluídas no plano de coleta do próximo ano.
Para o Presidente da Federação Flona, que representa mais de 1150 famílias e é detentora do Contrato de Concessão Real de Uso (CDRU), João Pedro, o uso sustentável da floresta é fundamental para garantir a subsistência das populações tradicionais. “Um grande desafio nosso é provar que a floresta é capaz de ajudar na economia do município, na melhoria da qualidade de vida das pessoas, gerando renda da própria floresta. Há uns anos atrás nós começamos a discutir o não madeireiro com outras instituições como a Coomflona, o Saúde e Alegria. Três comunidades tiveram maior interesse e criamos grupos para trabalhar com os óleos vegetais, da andiroba”.
Em 2019 surgiu a oportunidade da comercialização de sementes dos moradores para a empresa de cosméticos Natura. Em uma única venda foram comercializadas quase oito toneladas (7.840,30) gerando cerca de trinta e um mil reais para os manejadores.
Na Flona existe o manejo florestal madeireiro, que não atende a demanda de todos os moradores. “Então se pensou em trabalhar com as sementes. Só que ainda é pouco diante da demanda de sementes. Hoje em dia não se trabalha nem com 1/3 de sementes que se tem na Flona. O pensamento que nós temos é de trabalhar com maior número de pessoas, maior envolvimento de comunidades, com outros tipos de produtos como castanha, andiroba, óleos vegetais” – acrescentou Pedro.
“Quando a gente une as parcerias quem ganha são as famílias. A gente só tem a crescer. O que a gente quer é agregar mais valor na produção, tendo um comércio justo para nossa produção. Mas a gente só vai alcançar com a nossa organização, todo mundo produzindo, e todo mundo olhando as nossas comunidades” – Adailson Pereira, São Domingos Flona.