Distante dos grandes centros urbanos e isolados do acesso às tecnologias movidas a energia elétrica, os moradores da Resex na Floresta Amazônica foram desafiados a pensar o que necessitam e de que maneira o instrumento poderia ser construído. Em uma semana eles descobriram que é possível criar com pouco recurso e muita criatividade
Há quem diga que ticar peixe é uma arte. A técnica de cortar com precisão e agilidade para fritar o alimento é uma habilidade nata para os povos tradicionais que sobrevivem da pesca, que ainda assim demanda tempo. Pensando em otimizar a atividade, um dos cinco grupos de oficineiros resolveu resolver o problema com o ‘Ticador de peixe’. Uma faca adaptada e personalizada, como explica Moacir Rodrigues da Aldeia Vista Alegre Capixauã: “Com uma faca dessa de uma lamina que a gente usa no dia a dia a gente tirou 16 segundos pra cuidar de um charuto. Com essa faca aqui com seis lâminas, oito segundos”.
Na cozinha de quem mora na floresta o liquidificador faz falta. Sem energia elétrica,o equipamento não pode ser usado e motivou Joelma Lopes e os colegas a desenharem um protótipo de liquidificador à manivela: “a energia ainda é um problema na nossa comunidade e por isso a gente pensou em fabricar um liquidificador manual” – conta entusiasmada com a criação.
Tão necessário quanto, a máquina de lavar indispensável na rotina da dona de casa também foi idealizada manualmente. Com o atrito da roda da bicicleta um tanque adaptado em uma estrutura desempenha a mesma função de uma máquina elétrica. Bate com as estruturas internas e enxagua. Os idealizadores da invenção já planejam novas edições e melhorias: “futuramente quem sabe construir outra melhor ainda” disse Neiva Costa da comunidade Carão na Resex.
Na roça quem planta mandioca sofre na etapa do descascamento. A solução foi uma máquina movida a motor de rabeta com estrutura mecânica de ferro que descasca na medida. “Manualmente é muito difícil e demora demais. Com essa ferramenta vai facilitar a vida do agricultor que vai ter mais rendimento” destacou Daiana Pereira de São Pedro no Rio Arapiuns.
Para acabar com o carregamento da mandioca nas costas, um carro de madeira para ser adaptado em motocicletas. “A nossa invenção foi criada e colocada em prática” contou animado Wellhiton Amorim de Carão.
Oficina de Desenho e Co-criação de Tecnologias Apropriadas
Promovida pela World-Transforming Technologies com apoio do Projeto Saúde e Alegria a oficina foi realizada no Centro Experimental Floresta Ativa (CEFA) e objetiva ampliar a capacidade de inovação e de desenvolvimento tecnológico de baixo custo dos participantes para melhorar a vida de suas comunidades
A intenção é proporcionar conhecimento de como criar tecnologias simples para resolver problemas do dia a dia, utilizando diversas ferramentas e trabalhando com metal, madeira e outros materiais disponíveis localmente.
A RESEX Tapajós-Arapiuns foi laboratório de invenções no período de 18 a 23 de março. Moradores de São Pedro, São Miguel, Maripá, Samaúma, Aldeia Solimões, Anumã e Carão criaram soluções tecnológicas para auxiliar os comunitários na rotina.
O coordenador de empreendedorismo do PSA Paulo Lima anunciou a inauguração de um espaço fixo para as criações: “com muita alegria a gente vê o encerramento dessa grande iniciativa que também inaugura as atividades do Laboratório de Inovação Cidadã Rural aqui no CEFA. A ideia é que a gente dê mais condições, habilidades e competências para que eles possam inventar soluções e enfrentar as situações do dia a dia”.
O facilitador do Instituto invento Odair Scatolini contou sobre a metodologia usada na oficina: “executada em vários países do mundo, América Latina, África, Ásia, a nossa ideia é trabalhar, criar, desenhar e executar tecnologia com as comunidades, não para as comunidades. O que a gente está querendo é transformar as comunidades de consumidoras em criadoras de tecnologias”.
André Wongtschowski da World-Transforming Technologies finalizou as atividades desejando aos moradores sucesso nas criações futuras: “a gente torce para que seja o primeiro passo no movimento mais amplo e permanente de construção de tecnologias”.